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A burguesia conquistará o direito não somente ao Dinheiro Mundial e ao Moinho a vapor mas também, à Peste-bubônica

08/10/2019

Por Felipe Lustosa, Historiador e filósofo

Entre 1310 e 1315 o clima e os fenômenos da natureza causaram uma escassez na produção agrícola de trigo e de centeio, o pastoreio também fora prejudicado e o gado morria de fome; as leguminosas que constituíam a base alimentar do homem do baixo-medievo custavam a serem produzidas; o pão era insuficiente e o imposto de Talha[1], a Corvéia[2] e a Banalidade[3] recaiam com o dobro do peso sobre os ombros das classes dominadas expressadas na figura do servo da gleba o qual, nestas condições de pauperismo, encontrava-se malditamente miserável e vertendo por vezes à indigência.

Na primeira metade do século XIV, parte do campesinato fustigado pela fome e pela servidão resolve por evadir-se do sistema feudal e das corveias, estabelecendo-se naquilo que viria a ficar conhecido como Burgos. Os burgos eram as zonas limítrofes aos feudos, estavam para além de sua jurisdição, eram entrepostos comerciais independentes e vilas os quais não contavam com a administração e ingerência de um Senhor Feudal.

Os habitantes dos burgos passaram a ficar conhecidos como 'burgueses' e eram os burgueses os responsáveis pela circulação de excedentes nas feiras [os quais advinham da produção agrícola dos feudos, mas também de suas próprias propriedades]. Em Inglaterra os Burgos nasceram embrionariamente, em 1185. Tudo indica que estes habitantes [visando enricar] foram aqueles que desenvolveram as primeiras maquinas de moagem eólicas como o Moinho a vento (no Século XII) e foram estes mesmos habitantes de burgos britânicos que também desenvolveram formas mais sofisticadas de aragem do solo, substituindo o arado de pescoço (com apenas um dente) pela Charrua (um arado à tração equina, o qual prendia-se na cintura do animal e era composto por sete dentes os quais revolviam a terra com maior eficácia, criando mais extensos e profundos canais para a semeadura).

Os Burgos incharam-se com os camponeses que fugiam da Anúduva e durante o Século XIV foram os gametas dos vindouros centros urbanos modernos, outrossim, da acumulação otimizada de Capital. Com o inchaço dos Burgos e restabelecimento das rotas comerciais de monopólio que interconectavam a Europa à Ásia, a Europa viu abrolhar nas vilas as primeiras grandes epidemias de doenças: primeiro vieram o Tifo e o Cólera, em uma segunda etapa ganhou viço a temível Peste Bubônica, que já nas vilas do século XIV causou a morte de cerca de um terço dos Europeus.

Os excedentes de produção estocados tal como os restos de alimento e remanescentes das feiras, aliados ao mau-cheiro, ao péssimo saneamento básico e ao esgoto despejado nas calçadas de forma precária forneciam uma condição insalubre e as condições excelentes para que os ratos se reproduzissem: vindos da Ásia e alojado no seio do continente europeu [encontrando refúgio confortável em meio aos granários], o Ratus ratus, portador da bactéria Yersinia pestis, propagou-se no Continente e suas pulgas infestavam os animais de pasto e os próprios camponeses, transmitindo então, por via  deste hospedeiro da bactéria, a enfermidade.


O avanço das forças produtivas, a reintrodução das rotas comerciais e a circulação de excedentes trouxe consigo a evasão camponesa dos feudos, a conformação da urbes, a derrocada do feudalismo e a burguesia enquanto classe economicamente ativa, mas a língua ferina do Clero, dizia: também trouxe a peste como o "flagelo de Deus", por conta do amor dos enlameados burgueses pela luxúria e pelo ouro (auri sacra fames).

[1] - Talha: A talha era um imposto feudal pago pelos vassalos da terra para o custeio da defesa do feudo. Parte significativa da produção agrícola realizada no manso servil estava destinada à fruição do Senhor Feudal.

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[2] - Corveia: obrigação, presente no modo de produção feudal, correspondente à função servil através da prestação de serviços nas terras enfiteuticas ou instalações do senhor feudal.

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[3] - Banalidade: Direito banal de utilização das máquinas, poços, pontes, ferrarias e etc. Somente mediante ao pagamento de um foro ou renda.

Bibliografia:

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